Enquanto estava no banheiro, se encarando no espelho, Gael se relembrava, com dores, de seu passado.
Gael não gostava de lembrar. De fato, ele odiava – mas era impossível se esquecer de coisas que te machucaram ao longo da vida, certo? Ele sabia disso. Ele sentia em sua pele de novo, como se vivenciasse todas aquelas memórias ruins novamente; ele lembrava.
Lembrava das dores do abandono. Da traição. Das brigas. Das lágrimas derramadas. Do sofrimento do seu ser. O quanto se sentia corrompido pelo veneno que forçaram-no a tomar. Suas experiências passadas justificavam sua mente em agonia: elas gritavam mais alto que nunca, o falando como está condenado a vivenciar com a mente envenenada por pessoas sem misericórdia, e no quanto isso corrompeu seu próprio ser.
Agarrava seus cabelos com força: era uma forma de libertar sua dor. Uma forma de respirar fundo e não se cortar novamente, mas seus braços tremiam. A força dos punhos em seus fios doía, sentia o couro cabeludo latejar. Mas ele não se importava.
Gael não conseguia esquecer de como era tratado como um boneco. De como dançava para agradar todos à sua volta. De como tentava ser o mais amável possível para fazê-las ficar só para, depois, assistí-las rir e sair de uma em uma, o largando em um palco vazio sobre um holofote frio. Sua cabeça doía.
Sentia vertigem e queria vomitar, gritar, apenas qualquer coisa para fazer sua mente voltar ao normal. E não conseguira. Ele sequer pensava onde estava ou o que estava fazendo. Tudo o que ele conhecia era dor. Tudo o que sentia era dor. Tudo o que via era dor.
Mas mãos angelicais lhe abraçavam o peito; distante, uma voz clamava seu nome. As mãos o apertavam contra um corpo macio. A voz era fina, suave, o fez voltar para a realidade. Dizia para se acalmar. Lembrava-o constantemente que estava tudo bem. De que seu mundo atual era outro. E funcionou.
Gael não se lembra quando virou-se e olhou para a pequena figura o abraçando com olhos chorosos e preocupados. Ela vestia uma de suas blusas e cheirava a doces. Sua mente, antes em agonia, agora se acalmava com as doces memórias que criaram juntos nos meses passados.
Ariah. Ariah. Chamar seu nome e se deixar afundar em seu ombro, deixar-se ser abraçado e resgatado da prisão de dores era novo para si. Ele não sabia ou entendia como Ariah possuía tamanha paciência ou amor por ele. Mas ele aceitou sua ajuda. E embora ele visse a sombra do seu passado ao rodapé… ele deixou aquele momento de doce ignorância o levar embora.
“Sinto muito por ser um covarde agoniado. Eu deveria ser forte para você.”
“Não… não diga isso. Eu compreendo suas dores. Eu estarei aqui para você; estarei aqui para chorar e rir. Confie em mim.”
Confiar… era uma palavra da qual Gael possuía medo. Será ele capaz de se entregar a alguem mais uma vez? A arriscar estar sujeito a extrema sofrência ou em extremo júbilo? Eventualmente… eventualmente a vida lhe dirá, como sempre fez, da pior maneira.
